Relatório sugere repensar a forma como vemos os ultraprocessados e adotar escolhas mais inteligentes no dia a dia Crédito: Freepik
Alimentos ultraprocessados (AUPs) ganharam fama negativa, mas essa visão nem sempre é justa.
Um recente parecer científico da American Heart Association (AHA) questiona a ideia de que todos os ultraprocessados são prejudiciais à saúde

Ultraprocessados por Shutterstock
Embora muitos AUPs estejam ligados a efeitos negativos, o relatório, publicado em 8 de agosto na revista Circulation, traz uma perspectiva mais equilibrada. Cientistas da AHA apontam que alguns ultraprocessados possuem perfis nutricionais satisfatórios e podem integrar uma dieta saudável.
Os ultraprocessados costumam ter altos níveis de gorduras saturadas, açúcares adicionados e sódio, o que contribui para problemas cardiometabólicos, como infarto, AVC, obesidade, inflamação, diabetes tipo 2 e complicações vasculares.
Ainda assim, conforme ressalta o comunicado oficial sobre o parecer, “certos processos industriais são benéficos para preservar a segurança e reduzir custos, incluindo técnicas que prolongam a vida útil, controlam microrganismos, diminuem toxinas, mantêm qualidades funcionais e sensoriais (como sabor) e reduzem desperdício de alimentos.”
Embora exista muita evidência de que a “comida lixo” faz mal, o novo relatório da AHA indica que alguns alimentos processados podem ser consumidos com moderação dentro de uma alimentação equilibrada.
Alguns ultraprocessados são mais nutritivos que outros
“Os ultraprocessados mais saudáveis são aqueles que, mesmo após o processamento, oferecem benefícios como fibras, proteínas, vitaminas e minerais, e têm baixos níveis de açúcares adicionados, gorduras ruins e sódio”, explica Nichola Ludlam-Raine, nutricionista registrada e autora do livro How Not To Eat Ultra-Processed.
Exemplos de AUPs mais nutritivos incluem:
- Pães integrais
- Cereais matinais ricos em fibras
- Alguns laticínios
- Leites vegetais fortificados
Por outro lado, os menos saudáveis geralmente apresentam baixo valor nutricional e alto teor de gordura saturada, açúcar, sal ou aditivos, o que favorece o consumo excessivo de calorias.
“A principal diferença está nos ingredientes e no perfil nutricional, não apenas no nível de processamento”, reforça Ludlam-Raine.
Samantha Peterson, nutricionista funcional e fundadora da Simply Wellness, concorda. Para ela, os piores AUPs são:
- Bebidas açucaradas
- Snacks refinados
- Macarrão instantâneo
- Carnes processadas
“Esses produtos contêm açúcares e amidos de rápida absorção, gorduras inflamatórias, muito sódio e aditivos diversos. Isso pode causar picos de glicemia, desequilíbrio intestinal, inflamação crônica e aumentar risco de doenças cardíacas, diabetes e alguns tipos de câncer”, esclarece.
Ela acrescenta que o consumo frequente de ultraprocessados pobres em nutrientes pode levar à obesidade, resistência à insulina, hipertensão, colesterol elevado, desequilíbrio da microbiota intestinal e maior risco de doenças cardiovasculares e câncer.
Como interpretar rótulos
Enquanto alguns ultraprocessados têm pouco valor nutricional, outros podem fornecer nutrientes importantes e praticidade no dia a dia.
Especialistas recomendam atenção ao rótulo nutricional e à lista de ingredientes.
“Na escolha de AUPs, procure por pães ou cereais com pelo menos 3 gramas de fibra por porção”, aconselha Ludlam-Raine.
Ela também sugere iogurtes com 5 a 10 gramas de proteína e pouco ou nenhum açúcar adicionado.
Produtos fortificados são outro ponto positivo. Alimentos enriquecidos com cálcio, vitamina D, B12, ferro e iodo podem complementar a dieta de forma útil.
Em caso de dúvida, “listas de ingredientes mais curtas e reconhecíveis costumam ser um bom indicativo (mas nem sempre)”, diz ela.
Peterson reforça que é um bom sinal quando os primeiros ingredientes listados são alimentos in natura, como aveia, feijão, leite ou salmão.
Exemplos de ultraprocessados mais equilibrados
Segundo Ludlam-Raine, alguns exemplos de ultraprocessados com bom perfil nutricional são:
- Cereais matinais integrais fortificados: ricos em fibras, ferro e vitaminas do complexo B, desde que não contenham açúcar adicionado.
- Leites vegetais fortificados (soja ou amêndoa, sem carragenina): geralmente enriquecidos com cálcio e iodo, importantes para quem não consome laticínios.
- Leguminosas enlatadas (como feijão e grão-de-bico): apesar de ultraprocessadas, oferecem proteína vegetal e fibras. Lavar bem ajuda a reduzir o sódio.
- Pães integrais fatiados: desde que com baixo teor de sal e açúcar, são fonte de fibras e carboidratos complexos.
- Iogurte natural ou estilo grego com culturas vivas: podem beneficiar saúde intestinal e óssea.
Ela lembra que esses alimentos combinam praticidade e contribuem positivamente para a ingestão de nutrientes.
Ultraprocessados com moderação
Muitos ultraprocessados são acessíveis, práticos e podem fornecer nutrientes essenciais — especialmente para quem tem pouco tempo ou orçamento limitado.
Exemplos incluem feijão enlatado, pães integrais e leites vegetais fortificados, que oferecem fibras, proteínas e vitaminas com preparo mínimo.
Peterson ressalta que “processamento não é necessariamente ruim”. Técnicas como congelamento, fortificação e enlatamento podem preservar nutrientes e até beneficiar a saúde pública.
Ambas especialistas concordam que o equilíbrio é fundamental. Substituir refrigerantes por água com gás, trocar pão branco por integral e planejar refeições simples que combinem alimentos frescos, congelados e AUPs saudáveis faz diferença.
Ludlam-Raine recomenda a regra 80:20: 80% de alimentos in natura e 20% de espaço para ultraprocessados mais nutritivos. Os menos saudáveis devem ser consumidos de forma ocasional. Manter um diário alimentar pode ajudar a implementar mudanças simples, mas eficazes.
Optar por ultraprocessados mais equilibrados com moderação permite aproveitar a praticidade sem comprometer a saúde no longo prazo.
Fonte: Jornal Correio