Caps não é brincadeira: Centros de Atenção Psicossocial são espaços de acolhimento, cuidado e reintegração social

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Foto: Reprodução/Redes Sociais

No mês dedicado à prevenção do suicídio e à promoção da saúde mental, o Acorda Cidade esteve em um dos cinco Centros de Atenção Psicossocial (Caps) de Feira de Santana para mostrar o trabalho realizado nessas unidades e reforçar a importância dessa rede de apoio.

Mesmo com o tema sendo mais discutido atualmente, ainda circulam nas redes sociais mensagens depreciativas como “O paciente mais fraco do Caps” e “O diálogo mais fraco do Caps”, acompanhadas de vídeos de pessoas em situações constrangedoras e vulneráveis. Essas “brincadeiras” não têm e não devem ter graça. Elas reforçam o estigma em torno da doença mental e podem até afastar pessoas do tratamento.

Foto: Divulgação/ Secom

A luta antimanicomial não é de agora

A reforma psiquiátrica no Brasil surgiu nos anos 1970 e 1980 como um movimento social e político de crítica ao modelo manicomial, marcado por isolamento, abusos e violações de direitos humanos. Com o avanço da mobilização, foi aprovada a Lei 10.216, em 2001, conhecida como “Lei Paulo Delgado”, que garantiu direitos às pessoas com transtornos mentais, previu a progressiva desinstitucionalização de hospitais psiquiátricos e consolidou os Caps como eixo central da rede de cuidado.

Diferentes dos antigos manicômios, os Caps se baseiam em acolhimento humanizado, trabalho multiprofissional e reinserção social, promovendo a autonomia e a cidadania das pessoas em sofrimento psíquico. A mudança substituiu a exclusão pelo cuidado e pela valorização da dignidade das pessoas.

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Coordenador do Caps ll, Joadson Andrade | Foto: Ed Santos/Acorda Cidade

“Parece que começou ontem, então a gente ainda enfrenta algumas dificuldades, barreiras, questões culturais de que o paciente psiíquico deve ter isolamento, que ele é uma pessoa que oferece perigo à sociedade, mas nós temos conseguido muitos êxitos”, afirmou ao Acorda Cidade o coordenador de Saúde Mental do município, Joadson Andrade.

Atualmente, Feira de Santana conta com cinco Caps: dois Caps tipo II, um Caps AD III (voltado para álcool e drogas), um CAPS Infantojuvenil (Capsi) e um Caps tipo III, que atende 24h. Além disso, a cidade dispõe de oito residências terapêuticas e um ambulatório de saúde mental, que juntos compõem a rede de assistência à população.

abraço gratuito promovido pelo caps ad
Abraço gratuito promovido pelo Caps AD | Foto: Divulgação/Caps AD
  • O Caps tipo II, por exemplo, atende pacientes maiores de 18 anos, de segunda a sexta-feira, das 7h às 19h. O espaço não funciona nos fins de semana nem aos feriados.
  • O Caps AD atende ao público que tem dependência química de álcool e outras drogas, além de transtornos mentais secundários ao uso dessas substâncias.
  • O Caps Infantojuvenil atende crianças e adolescentes de até 18 anos, também de segunda a sexta-feira.
  • O novo Caps III atende o mesmo perfil do CAPS II, mas funciona todos os dias da semana, 24h por dia.
Caps
Foto: Ed Santos/Acorda Cidade

Clique aqui para conferir os endereços dos CAPS em Feira de Santana

Para quem enfrenta sofrimento mental, a importância dos Caps, vai muito além do tratamento clínico.

“O Caps busca resgatar a condição do sujeito no protagonismo da sua vida, estimulando-o às atividades do cotidiano, reabilitando-o socialmente, fazendo-o entender que a doença mental é grave, que não tem cura, mas tem tratamento, e que ele pode e deve ser considerado um cidadão como qualquer outro.”

Esse trabalho de reinserção social se reflete em conquistas diárias dos pacientes e também da equipe que acompanha a evolução de cada um. “Encaminhar pacientes ao mercado de trabalho, fazer com que eles desenvolvam atividades terapêuticas, a oficina de geração de renda, que é um grande e importante serviço que temos nos CAPS. Mulheres hoje fazem artesanato, conseguem vender e viver desse trabalho, então é muito importante”, destacou.

Debochar do Caps não tem graça

Este mês, o Ministério da Saúde fez uma publicação nas redes sociais para chamar atenção para as “brincadeiras” com os centros. A campanha “CAPS não é meme” trouxe informação para que as pessoas que precisam, sejam acolhidas pela instituição. Veja a campanha aqui.

caps ministério da saúde
Foto: Reprodução/Redes Sociais

Para o coordenador, essas associações grotescas aos Caps são apenas mais uma forma de fortalecer a ignorância e o preconceito entre as pessoas. “As pessoas têm feito essa brincadeira que não tem graça, associando qualquer situação ao Caps como se a loucura se instalasse de modo geral. Termos pejorativos contribuem para o fortalecimento do estigma”, alertou.

Desde a implantação do primeiro Caps em Feira, o Oscar Marques, em 2005, houve grande progresso no acesso e na aceitação do serviço. Segundo ele, antigamente, as pessoas tinham vergonha de serem vistas entrando nesses ambientes e, hoje, principalmente após a pandemia da covid-19, que trouxe isolamento e evidenciou mais doenças mentais, essa vergonha diminuiu. Hoje, cerca de 44 mil pessoas são acompanhadas nos Caps da cidade.

CAPS III
Foto: Paulo José/Acorda Cidade

“As pessoas precisam entender que existe um leque de doenças: doenças agudas, que são tratáveis e curáveis, e doenças crônicas. A doença mental pode ser tratada e a pessoa viver normalmente. Esse diálogo deve ser permanente em todos os serviços.”

O coordenador explicou ainda que os serviços seguem critérios de atendimento. Os Caps atendem, prioritariamente, pacientes com transtorno mental grave, enquanto transtornos leves devem ser tratados na atenção básica. Vale ressaltar que qualquer pessoa que sentir necessidade de atendimento pode buscar o serviço.

“Ela será acolhida e terá sua história ouvida. Caso tenha o perfil, fazemos os encaminhamentos internos: psiquiatra, acompanhamento psicológico, oficinas e grupos terapêuticos. Após o acolhimento, ela é direcionada aos serviços considerados necessários.”

Mas o que pode ser considerado transtorno grave?

“São os transtornos que impossibilitam ou têm grande impacto na vida da pessoa, a ponto de ela não conseguir desenvolver atividades no trabalho, na escola ou no cotidiano”, explicou Joadson. Ele ressaltou que esse tipo de transtorno não está necessariamente ligado à agressividade, que é mais um estigma da sociedade.

“A agressividade e a agitação psicomotora são sintomas de algumas doenças mentais quando não tratadas. A pessoa pode ter depressão leve, trabalhar, estudar, e aquilo não impactar significativamente sua vida. Na depressão moderada ou grave, o indivíduo já não consegue sair de casa, tem baixa autoestima, e isso começa a refletir no ambiente de trabalho; então, esse é o transtorno grave”, explicou.

Hospital Lopes Rodrigues

Antigamente, o Hospital Lopes Rodrigues era conhecido como “colônia”, e havia grande estigma associado ao local, justamente por ter sido um espaço manicomial. Hoje, ele foi ressignificado como um importante equipamento da rede de atenção psicossocial de Feira de Santana.

hospital especializado lopes rodrigues
Foto: Redes Sociais

“Buscamos tratar os pacientes nos Caps para que não precisem acessar a emergência do Lopes. Mas, caso necessário, eles podem e devem buscar o serviço ou ser encaminhados.”

No mês de setembro, Joadson Andrade também reforçou que falar sobre saúde mental e cuidar dela deve ser uma ação durante todo o ano. Neste mês, as pessoas se sensibilizam com o tema, mas esquecem que essa empatia deve ser diária, consigo mesmo e com o outro.

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Foto: Freepik

“É o olhar da família, do amigo, sobre aquele indivíduo que está em sofrimento psíquico. Estamos intensificando isso nas redes, nas unidades básicas de saúde e nas escolas, para que não percamos vidas por não apoiar e não encaminhar esses indivíduos ao serviço de saúde mental”, alertou o coordenador.

Com informações do repórter Ed Santos do Acorda Cidade

Fonte: Acorda Cidade

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