Artigo – Finanças não são assunto só de adulto

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Foto: Reprodução

Cheguei à sala de aula do caçula com uma foto, um diploma e tempo reservado para ouvir. O ritual marcava a passagem do infantil para o fundamental. Entre perguntas curtas e silêncios atentos, ficou evidente o essencial: decisões maduras nascem de hábitos simples treinados cedo.

Quando contamos nossa trajetória para crianças, damos nome ao que sustenta escolhas: esforço, paciência, gentileza, curiosidade. Ao fazer isso, enxergamos o que precisa de ajuste agora para funcionar depois. É gestão em escala doméstica: visão de longo prazo aplicada a rituais pequenos e repetidos.

Entre esses fundamentos, há um que quase sempre fica para depois: finanças. Adiamos ao rotulá-lo como “assunto de adulto”. Falar de finanças com crianças não é apressá-las. É dar vocabulário para a liberdade. Quem aprende cedo a nomear prioridades entende que recursos são finitos e que decidir implica escolher caminhos e renunciar a outros. Crianças que praticam isso hoje tendem a se tornar adultos que combinam ética, cálculo e cuidado.

Para tirar isso do discurso e levar para o cotidiano, vale um caminho leve e objetivo. Três práticas ajudam. A primeira é trabalhar decisões concretas. No supermercado, combinamos um valor e montamos a lista juntos; priorizar vira experiência, não sermão. 

A segunda é definir destinos claros para cada recurso: usar, guardar, partilhar em potes visíveis. Aos poucos, o guardar vira investir e a conversa passa a incluir paciência, risco e horizonte. A terceira é acompanhar o erro. Se tudo é gasto no primeiro dia, o restante da semana vira sala de aula de consequência e planejamento. Custa pouco e ensina muito.

No trabalho, chamamos essa disciplina de ambidestria:  explorar possibilidades enquanto entregamos o combinado. Em casa, o princípio é o mesmo. Curiosidade tem espaço, critérios permanecem estáveis. Essa combinação reduz a ansiedade, organiza desejo e constrói autonomia. É governança aplicada ao cotidiano, um sistema simples de acordos que protege a família do improviso.

Também convém lembrar que todo indicador carrega uma história humana. O orçamento doméstico não foge à regra. O que parece número é a conta que mantém a luz acesa, a comida que sustenta a semana, o cuidado que preserva a saúde e o futuro que guardamos aos poucos.  Ele representa o tempo de quem trabalha, a atenção de quem cuida, os limites que protegem e os sonhos que pedem paciência. Quando a família fala disso com clareza e respeito, cresce o senso de pertencimento. E pertencimento sustenta aprendizado. Foi com essa imagem concreta em mente que encerrei a manhã.

Saí da escola com o mesmo lembrete que aplico na empresa: fundamento claro reduz ruído, evita atalhos ruins e melhora a qualidade das decisões. Em casa, vale igual. Finanças entram nessa lista. Quanto antes, melhor. É um aprendizado que não cabe na mochila e acompanha a vida inteira.

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LUCIANA ZANINI Investidora, Conselheira, C-Level e CFO do Inhotim

Fonte: BH em pauta

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