O tarifaço e algumas de suas implicações na gestão dos negócios e empresas

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Imagem gerada por IA.

O chamado “tarifaço”, de Donald Trump contra o Brasil, tem se consolidado como um dos principais pontos de tensão no cenário econômico brasileiro de 2025, impactando diretamente a forma como as empresas nacionais planejam suas estratégias de sobrevivência e crescimento.

Desde o início do ano, os Estados Unidos haviam sinalizado a intenção de impor tarifas mais duras, mas a escalada anunciada em julho, com a aplicação de 50% sobre praticamente todos os produtos brasileiros a partir de agosto, representou um choque.

Ainda que alguns setores tenham sido poupados, como aviões da Embraer, suco de laranja, fertilizantes e minério de ferro, a medida atingiu 35,9% do valor exportado aos EUA, o que corresponde a cerca de 4% de todo o mercado externo do país. Existem setores radicalmente transformados, como a exportação de café e frutas tropicais. No caso do café, por exemplo, agosto marcou um aumento acelerado de preços do produto junto ao consumidor americano nunca visto anteriormente.

O governo brasileiro reagiu de imediato, acionando a Organização Mundial do Comércio e preparando contramedidas internas. Entre elas, destacou-se a criação de um pacote de R$ 30 bilhões em créditos para exportadores, adiamento de impostos e instrumentos de seguro, no âmbito do programa “Brasil Soberano”.

O ministro Fernando Haddad e a equipe diplomática reforçaram que a responsabilidade pela solução do impasse caberia aos EUA, ao mesmo tempo em que o presidente Lula buscava aproximar o Brasil de outros polos de influência, como os BRICS e a União Europeia, tentando reduzir a dependência de Washington. Toda essa discussão ainda vem ocorrendo, sem qualquer sinal de solução evidente no curto prazo.

O impacto disso no dia a dia das empresas

Enquanto isso, as empresas brasileiras enfrentam um ambiente de grande instabilidade. Não é apenas o tarifaço que preocupa. O cenário global carrega uma sequência de crises: as eleições na Bolívia, ameaças contra o regime venezuelano e o rearranjo de poder na América Latina, a guerra da Ucrânia e da Rússia, os conflitos em Gaza e as ameaças do Irã de retomar ações contra Israel são algumas delas.

Somam-se as incertezas sobre novas tarifas contra a Índia e o impasse ainda aberto com a China. Dentro do Brasil, a taxa Selic em 15% encarece o crédito, pressiona o custo de capital e dificulta o financiamento de investimentos produtivos e mais ainda no ecossistema de inovação.

Os custos de aquisição de clientes também aumentam, especialmente no ambiente digital, onde plataformas de mídia e publicidade elevaram suas tarifas. Para empresas que precisam conciliar importações, exportações, marketing e financiamento, trata-se de um cenário quase sufocante.

Nesse contexto, setores específicos reagem de formas distintas. A indústria química, representada pela Abiquim, já expressou forte preocupação, alertando para o risco de demissões em massa e paralisação de investimentos devido ao peso dos insumos importados. O agronegócio, especialmente carnes e café, prevê perdas que podem ultrapassar US$ 1,5 bilhão, já que esses produtos não foram contemplados nas isenções americanas.

Por outro lado, companhias como a WEG e a Gerdau anunciaram estratégias de mitigação, ajustando cadeias logísticas e buscando diversificação de mercados. Há também reações mistas: se alguns setores respiraram aliviados por terem obtido exceções nas tarifas, outros se veem diante de incertezas que tornam inviável qualquer planejamento de longo prazo.

Em paralelo, empresários brasileiros já agendam visitas aos Estados Unidos, em setembro, para reuniões com a Câmara de Comércio e representantes do governo americano, numa tentativa de reverter parte das medidas.

Fazer o básico bem feito

Em meio a tantos dilemas, as corporações brasileiras têm se voltado para o que chamam de “fazer o básico bem feito”. Essa máxima ganha força quando as condições externas se tornam imprevisíveis.

Em vez de se apoiarem apenas em perspectivas de crescimento pela exportação, muitas empresas estão focando em monetizar sua base de clientes atual, aprimorar o relacionamento com consumidores e reforçar a integração entre canais digitais e físicos. Estratégias omnichannel e programas de CRM e loyalty são vistas como fundamentais para fidelizar clientes, evitando que eles migrem para concorrentes em momentos de crise.

Paralelamente, os gestores trabalham para ajustar portfólios de produtos e preços à realidade do consumidor brasileiro, que, mesmo sob pressão inflacionária e alta dos juros, não deixa de consumir, mas busca alternativas que caibam no bolso.

Empresas que atuam com clientes de alto valor se esforçam para oferecer diferenciação, enquanto aquelas voltadas para as classes C e D apostam em modelos escaláveis e soluções de baixo custo de servir, viabilizadas pelo uso intensivo de tecnologia.

Outro eixo de adaptação é a adoção de inteligência artificial e automação em processos internos. Apesar de ainda ser tratada como modismo por alguns, a IA tem se mostrado promissora na personalização de ofertas em escala, na gestão de dados de clientes e na busca por eficiência operacional.

Em um ambiente de custos crescentes e margens comprimidas, qualquer ferramenta que permita reduzir despesas e aumentar a assertividade na tomada de decisão torna-se estratégica. Mais do que nunca, as empresas precisam conciliar inovação tecnológica com pragmatismo, encontrando soluções que sejam viáveis financeiramente e tragam resultados tangíveis.

Temos implementado soluções nessa linha junto a alguns de nossos clientes, e é fato que esses projetos chegam a representar até 20 a 25% do resultado de faturamento para o ano, principalmente quando a gestão do relacionamento com os clientes está altamente personalizada e assertiva.

Decisões unilaterais, impactos globais

O tarifaço, portanto, não é apenas um episódio pontual de atrito comercial entre Brasil e Estados Unidos, mas um símbolo da vulnerabilidade das economias emergentes diante de decisões unilaterais das grandes potências, e que serão mais frequentes em um contexto de “Guerra Fria 2.0”.

Ao mesmo tempo, funciona como catalisador para uma mudança de mentalidade dentro das empresas brasileiras. Se até pouco tempo a aposta estava concentrada na expansão para mercados consolidados, agora há um movimento crescente de diversificação, tanto geográfica quanto estratégica.

As oportunidades com a China, a Europa e os próprios países da América Latina surgem como alternativas viáveis, especialmente porque, no médio prazo, depender menos de um único parceiro comercial significa reduzir riscos e ganhar margem de manobra.

Dessa forma, embora o tarifaço de Trump tenha ampliado as incertezas e pressionado setores vitais da economia brasileira, ele também abriu espaço para reflexões importantes sobre resiliência e autonomia, bem como sobre a vocação futura do país e seu papel dentro de um planeta altamente interdependente.

O ambiente é turbulento, os desafios são enormes e a dúvida entre executivos e conselhos de administração é generalizada. Mas uma certeza permanece: com maior ou menor renda, os consumidores continuarão comprando. Cabe às empresas, diante desse cenário adverso, redescobrir sua eficiência, fortalecer sua relação com o cliente, ajustar seu portfólio, investir em tecnologia e diversificar suas apostas internacionais. Esse talvez seja o caminho mais realista para atravessar a tempestade sem perder o rumo. Pelo menos, é aquilo que temos ajudado empresas líderes a fazer e a obter resultados superiores a seus pares no curto prazo de forma bastante pragmática.

Fonte: E-Commerce Brasil

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