O Dia das Crianças e a coragem de quem luta pela vida todos os dias

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Bianca Provedel*

Ser mãe muda tudo. Quando meu filho nasceu, entendi, de forma visceral, o que significa colocar a vida de outra pessoa acima da sua. Essa é a essência da maternidade: uma mistura de amor incondicional com coragem diária. Talvez por isso, ao entrar em contato com tantas famílias atendidas pelo Instituto Ronald McDonald, eu me veja tantas vezes no olhar dessas mães. Elas carregam a mesma determinação, mas em condições muito mais duras: a de acompanhar um filho em tratamento contra o câncer.

Neste Dia das Crianças, enquanto muitas famílias celebram com presentes, passeios e sorrisos, milhares de meninos e meninas no Brasil estarão em hospitais. Em vez de escolher brinquedos, seus pais estão diante de prontuários, exames e medicamentos. São crianças que, apesar da doença, continuam sendo crianças: brincam, sonham, pedem colo. A diferença é que sua infância acontece em meio a agulhas, salas de quimioterapia e longas viagens até centros de tratamento.Publicidade

De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), cerca de 8 mil novos casos de câncer infantojuvenil são diagnosticados por ano no país. E, embora a medicina avance, a taxa média de sobrevida no Brasil ainda é de 64%. Nos centros apoiados pelo Instituto Ronald McDonald, conseguimos alcançar 72%, resultado de investimentos em diagnóstico precoce, atenção integral e, sobretudo, humanização. Esse dado nos enche de esperança, mas também mostra o tamanho do desafio: não basta tratar a doença, é preciso cuidar da família como um todo.

Pesquisas internacionais da Ronald McDonald House Charities (RMHC) revelam que 51% das famílias de crianças com câncer vivem abaixo ou na linha da pobreza, e 37% relatam ter ao menos uma necessidade básica não atendida, alimentação, transporte, moradia, acesso a internet, até mesmo fraldas e material escolar. É impossível esperar que uma mãe consiga acompanhar o tratamento do filho com serenidade quando não sabe como chegar ao hospital ou o que vai servir no jantar.

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Foi justamente para enfrentar essa realidade que surgiram os Programas Casa Ronald McDonald e o Espaço da Família Ronald McDonald. A Casa oferece hospedagem gratuita, refeições, transporte até os hospitais, atividades pedagógicas e apoio psicossocial em um ambiente acolhedor, que faz as famílias se sentirem em casa. Já o Espaço da Família, dentro dos hospitais, oferece um local confortável para descanso, apoio emocional e momentos de alívio durante a rotina de tratamento. Somente em 2024, juntos, esses programas atenderam milhares de famílias em todas as regiões do Brasil.

Essas iniciativas ganham ainda mais relevância diante dos dados da pesquisa realizada com as famílias apoiadas: mais de 84% afirmaram que não teriam onde se hospedar caso não conseguissem uma vaga em uma Casa Ronald McDonald, e mais de 72% têm renda familiar de até um salário mínimo. Isso mostra o quanto o acolhimento oferecido é essencial para garantir o acesso contínuo ao tratamento

Acredito profundamente que a humanização salva. Uma criança que encontra uma sala de aula dentro do hospital, que participa de uma oficina de arte, que vê a mãe descansando em um quarto limpo e seguro, ganha forças para continuar. Essa rede de cuidado reduz o abandono do tratamento e, em muitos casos, pode significar a diferença entre a vida e a morte.

Como mãe, me sinto tocada de forma pessoal toda vez que vejo uma criança correndo pelos corredores das Casas Ronald depois de uma sessão de quimioterapia, ou quando escuto de uma mãe que, pela primeira vez em semanas, conseguiu dormir tranquila porque sabia que seu filho estava acolhido. Esses momentos me lembram que, por trás de cada número, existe uma história. E cada história merece ser contada, cuidada e preservada.

O Dia das Crianças é sobre celebrar a infância. Mas ele também pode ser sobre solidariedade, empatia e responsabilidade coletiva. Cada gesto importa. Uma doação, um ato de voluntariado, uma parceria institucional, tudo isso pode transformar a vida de uma criança em tratamento oncológico e dar fôlego a uma família que já enfrenta tanto.

O que desejo neste 12 de outubro é que o Brasil não esqueça das crianças que não estarão nos shoppings, mas sim nas enfermarias. Que possamos enxergar nelas não apenas pacientes, mas crianças plenas, com direito ao brincar, ao aprender, ao sonhar. Que cada uma delas tenha não apenas chances de cura, mas também a oportunidade de viver sua infância com dignidade, mesmo nos dias mais difíceis.

É para isso que lutamos diariamente no Instituto Ronald McDonald. Porque quando cuidamos da criança e de sua família, cuidamos do futuro de todos nós.

* Jornalista, psicóloga, mãe, e há 20 anos atua no terceiro setor. É CEO do Instituto Ronald McDonald.

“Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornal Hoje em Dia”.

Fonte: Hoje em Dia

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