O Ministério da Educação (MEC) está prestes a divulgar um novo conjunto de diretrizes para o funcionamento dos cursos superiores na modalidade de Educação a Distância (EaD) no Brasil. Desenvolvido por meio de processo de consulta com especialistas e entidades do setor, tem como objetivo atualizar as normas que regem a oferta de cursos nessa modalidade. As novas regras devem abordar aspectos como credenciamento de instituições, expansão da oferta e novos referenciais da qualidade do ensino a distância, considerando o cenário atual e as inovações tecnológicas disponíveis.
É justamente sobre este último ponto que quero comentar neste artigo. É de conhecimento comum que o setor educacional enfrenta inúmeros desafios, mas quando olhamos com mais atenção ao EaD no ensino superior, a qualidade na produção dos materiais tem se tornado um gargalo relevante na formação de novos profissionais.
A educação é um dos setores mais fundamentais para o desenvolvimento de qualquer sociedade, mas também é um dos mais resistentes à mudança. Além disso, os incentivos econômicos para a adoção de tecnologias são menos claros, já que os benefícios muitas vezes são de longo prazo e difíceis de quantificar. Em muitos casos, os investimentos em tecnologia são vistos como custos adicionais, em vez de oportunidades de melhoria.
O novo marco regulatório da educação a distância (EaD) pretende estabelecer quais são os critérios de qualidade para orientar a oferta de cursos no ensino superior, com conteúdos relevantes. É aqui que os avanços tecnológicos começam a desempenhar um papel estratégico, pois é por meio deles que conseguimos observar uma crescente demanda por materiais didáticos digitais, porque além de diminuir o alto custo com impressão e logística em locais de difícil acesso, eles acabam sendo mais práticos e maleáveis para serem atualizados, atendendo às novas demandas do mercado e da sociedade.
Além disso, a educação digital proporciona um nível maior de flexibilidade e personalização, algo que os materiais tradicionais não poderiam alcançar. Com as tecnologias de Inteligência Artificial e aprendizado adaptativo, é possível criar experiências de acordo com as necessidades de cada aluno.
As plataformas digitais também permitem o acesso a qualquer hora e lugar, rompendo barreiras geográficas. Uma outra vantagem é a alta interatividade, com quizzes, fóruns de discussão, videoaulas e feedbacks instantâneos que tornam a jornada de aprendizagem única. Essa automação não só libera tempo para professores e administradores se concentrarem em atividades de maior valor agregado, mas também reduz custos operacionais. Para instituições privadas, isso significa maior competitividade no mercado.
Para instituições públicas, significa a possibilidade de alocar recursos de forma mais eficiente. A adoção de IA na gestão educacional é, portanto, um investimento estratégico que pode gerar retornos significativos a médio e longo prazo.
Apesar de positivo, ainda temos diversos desafios na transição para o digital em relação a países como a Coreia do Sul, que é um dos líderes globais em tecnologia educacional. Para se ter uma ideia, o país investe pesadamente em infraestrutura digital e formação docente, com 95% das escolas utilizando plataformas de aprendizagem online. Além disso, o governo sul-coreano promove políticas de inclusão digital, garantindo que todos os alunos tenham acesso a dispositivos eletrônicos e internet de alta velocidade.
Já a Estônia é um exemplo de como políticas públicas integradas podem transformar a educação. O país investe em infraestrutura digital desde a década de 1990, e hoje todas as escolas têm acesso à internet de alta velocidade. Além disso, os alunos aprendem programação desde cedo, preparando-se para as demandas do mercado de trabalho do futuro.
No Brasil, sem dúvidas, o maior obstáculo é o acesso à internet em muitas regiões afastadas do país. De acordo com uma pesquisa recente do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) referente a 2023, quase 6 milhões de brasileiros ainda não têm acesso à internet, pelo alto custo e a cobertura de rede não atender a região do domicílio.
Para efeitos de comparação, em 2003, apenas 15,3% dos domicílios brasileiros tinham computador e, desses, apenas 11,4% acessavam a internet. Apesar dos avanços ao longo dos mais de 20 anos, ressalto que é importante haver um trabalho em conjunto de empresas do setor educacional, instituições de ensino, governos e organizações não-governamentais para que se mobilizem em prol de políticas públicas de acesso à internet, para que todos possam ter acesso à educação digital de qualidade.
Mesmo diante desses desafios, há indícios de que a transformação está em curso, impulsionada por mudanças no marco regulatório, pela expansão da conectividade, pelo crescimento da educação híbrida e pela adoção de ferramentas digitais nas universidades. Esses fatores estão moldando o cenário educacional e influenciando a forma como o ensino é estruturado.
* CEO da Realize, edtech focada na produção de conteúdo EAD
Fonte: Hoje em Dia